Plano de Monitoramento Entomológico para a Prevenção da Febre Amarela na Cidade Japeri
Por Rildo Ferreira
Introdução
Em virtude das ocorrências de morte de primatas por Febre Amarela (FA) na Mata Atlântica da Região da Baixada Fluminense as cidades devem preparar um conjunto de ações para a prevenção da FA fazendo um bloqueio entre a zona Atlântica e a zona urbana das cidades evitando, assim, um surto de FA entre humanos atacando diretamente os transmissores do vírus, em especial seus criadouros fartamente encontrados em terrenos baldios e imóveis residenciais.
Para Japeri, o bloqueio entomológico que se pretende demanda de uma ação fora dos padrões adotados para o controle do Aedes aegypti e pode ser compreendido pelas seguintes etapas:
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imunização dos agentes que atuarão na região de monitoramento.
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Pesquisa Entomológica com desenho cartográfico dos vetores.
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Identificação dos imóveis positivos para Aedes aegypti/albopictus, Sabethes e Haemagogus.
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Imunização dos residentes nas localidades pesquisadas.
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Monitoramento semanal dos imóveis positivados e dos dois imóveis imediatamente laterais.
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Borrifação de inseticida por meio aeroespacial para os casos de localidades com índice igual ou superior a 3% de infestação predial.
A execução dessas ações visa essencialmente prevenir a entrada do vírus no cinturão urbano das cidades e, assim, evitar mortes por Febre Amarela entre a população da região.
Fundamentação
Com o crescimento infelizmente ainda desordenado das cidades que compõem a Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro, inclusive com avanço sobre este cinturão verde-atlântico, ocasionando inevitável aproximação do homem com animais silvestres e com a crescente onda de informações sobre mortes de primatas tem deixado em pânico os moradores da região levando-os a procurar os serviços de saúde e a exigir do poder público ações que possam tranquilizá-los.
Ora, Ocorre com surpreendente frequência a notícia de mortes de primatas infectados com o vírus da FA no cinturão de Mata Atlântica na região da Baixada Fluminense ainda que pese o fato de que as instituições responsáveis tenham identificado apenas um como sendo pelo vírus da FA. Em contrapartida, notícias veiculadas pela imprensa mostram elevado número de primatas mortos por FA no Estado de São Paulo e o próprio ministro da saúde contribuiu para alarmar a população ao afirmar pela imprensa que “Morte de macacos é sinal de novo ciclo de febre amarelai”. O G1ii noticiou a morte de mais de 80 primatas na cidade de Jundiaí, em São Paulo. O mesmo Giii1 informou a morte de outros 7 primatas na cidade de Louveira, SP.
No sítio da Fiocruziv um artigo esclarece:
O Brasil vivencia um dos períodos de maior mortandade de primatas da história devido à febre amarela silvestre no país, segundo a Sociedade Brasileira de Primatologia (SBPr). Além das mortes pela infecção pelo vírus, autoridades suspeitam que macacos estejam sendo executados pela população pelo medo de transmissão da doença.
Entretanto a diretora do Instituto de Ciência e Tecnologia em Biomodelos (ICTB/Fiocruz) e veterinária, Carla Campos afirma que esses primatas “assim como o homem, são hospedeiros do vírus e não reservatórios da doença. Os vírus ficam vivos neles por um período de tempo muito curto” (idem). Essa afirmação combinada com as alarmantes notícias veiculadas favorece e recomenda um trabalho preventivo, sobretudo para tranquilizar os moradores da região limite com a zona Atlântica.
Sobre a Febre Amarela
A primeira epidemia de febre amarela urbana no Brasil ocorreu em Recife/PE, em 1685, e na Bahia no ano seguinte com 900 óbitos. A doença foi controlada e ficou por mais de um século sem registro de casos, mas em 1849, em Salvador, na Bahia, foram registradas 2.800 mortes. Neste mesmo ano, ocorreu a primeira epidemia no Rio de Janeiro, que acometeu mais de 9.600 pessoas e registrou 4.160 óbitos. Entre 1850 a 1899, a doença se alastrou por todo o país quando Emílio Ribas, diretor do Serviço Sanitário do Estado de São Paulo organizou a primeira campanha adotando medidas específicas contra o Aedes aegyptii.
A febre amarela é uma doença infecciosa febril aguda, causada por um arbovírus (vírus transmitido por artrópodes), que pode levar à morte em cerca de uma semana, se não for tratada rapidamente. Os casos da doença no Brasil são classificados como febre amarela silvestre ou febre amarela urbana. O vírus causador e os sintomas clínicos da doença são os mesmos nos dois casos: a diferença entre elas é o mosquito transmissor. Na febre amarela silvestre, os mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes transmitem o vírus e os macacos são os principais hospedeiros. Nessa situação, os casos humanos ocorrem quando uma pessoa não vacinada adentra uma área silvestre e é picada por mosquito contaminado. Na febre amarela urbana, o vírus é transmitido pelos mosquitos Aedes aegypti ao homem. O Brasil não registra casos desta doença desde 1942ii.
O vírus amarílico é o protótipo do gênero Flavivírus, da família Flaviviridae (amarelo em Latim). É um RNA vírus. Pertence ao mesmo gênero e família de outros vírus quecausam doenças no homem, tal como o Dengue, por exemplo.
Na forma silvestre, os primatas não humanos são os principais hospedeiros do vírus amarílico, principalmente os macacos pertencentes aos gêneros Cebus (Mac Alouatta (guariba), Ateles (macaco aranha) e Callithrix (sagui).
Os macacos Alouatta, assim como os Callithrix e Ateles, são muito sensíveis ao vírus e apresentam taxa de letalidade elevada. Já os Cebus infectam-se facilmente, mas apresentam baixas taxas de letalidade e geralmente desenvolvem imunidade.
Diversos mamíferos também são suscetíveis à doença, destacando-se os marsupiais e alguns roedores que funcionam possivelmente mostrado a participação do gambá, porco espinho e do morcego no ciclo silvestre da doença. Contudo, a importância epidemiológica destes animais na manutenção da doença ainda não é conhecida.
Na forma urbana, o homem se constitui no único hospedeiro. Os animais domésticos não parecem ser susceptiveis ao vírus amarílico. A infecção experimental destes animais mostra baixo nível de suscetibilidade, embora os cães desenvolvam resposta febril após inoculação periféricaiii.
Os vetores
Sabethes (sp)
Mosquitos do Gênero Haemagogus, particularmente da espécie janthinomys, e do Gênero Sabethes preferenciam (não exclusivo) se alimentar em primatas, hábito que fazem destes amplificadores do vírus de FA. No Brasil, o principal vetor é o Aedes aegypti. Ainda não se sabe do papel do Aedes albopictus na transmissão do vírus, mas mantê-lo sob vigilância e controle é essencial para evitar descobrir pela maneira mais trágica da sua capacidade de transmissibilidade.
Haemagogus (sp)
Para a situação do momento é essencial fazer uma cartografia vetorial nas localidades que fazem a transição entre a zona urbana e a Mata Atlântica para que seja feito um monitoramento vetorial e, assim, fazer um bloqueio impedindo uma possível entrada do vírus na zona urbana.
O laboratório de Entomologia alerta para a presença de mosquitos da tribo Sabethini em Japeri. É comum encontrar entre larvas de Aedes e Culex larvas de Limatus durhami (da tribo Sabethini, o que leva a suspeita de existir outros gêneros, incluindo o Sabethes).
O que se propõe
Diante do inusitado aparecimento de um primata morto por vírus da FA na Reserva Biológica de Tinguá obriga as cidades circunvizinhas a tomarem medidas preventivas para evitar a reintrodução do vírus nas zonas urbanas, diante disso, o Laboratório de Entomologia propõe a realização de um CINTURÃO DE BLOQUEIO ENTOMOLÓGICO numa região que compreende toda a faixa limítrofe da cidade Japeri com a Mata Atlântica desde Beira Rio, em Japeri, até Laranjal, nos limites com a cidade Queimados. As localidades e os setores censitários compreendidos nesse cinturão estão descritas no quadro abaixo por classificação de risco, por bairro e apresenta a quantidade de imóveis a serem visitados e uma estimativa da quantidade de pessoas a serem monitoradas.
- Quadro demonstrativo dos setores censitários a serem trabalhados na prevenção da Febre Amarela
Fonte: Reconhecimento Geográfico | Olício Silva
Um bloqueio entomológico exige uma modalidade de trabalho semelhante ao Levantamento de Índice mais Tratamento (LI+T) já praticado nos tempos da antiga Superintendência de Campanhas de Saúde Pública (Sucam) e, posteriormente, pela Funasa. Trata-se de visitar TODOS os imóveis dos setores dentro da margem com largura de até 600 metros do limite das localidades que margeiam a Mata Atlântica desde Beira Rio, em Japeri, até Laranjal, em Engenheiro Pedreira, limite com a cidade Queimados para o centro urbano.
O objetivo do LI é fazer a cartografia vetorial entomológica identificando todos os imóveis positivos para esses vetores descritos. Esses imóveis serão objeto de monitoramento a fim de manter controle sobre o inseto. Tratar todos os depósitos é fundamental para iniciar um controle biológico atacando as larvas evitando que o inseto se torne adulto. A identificação do imóvel positivo também servirá para que a equipe de Vigilância Epidemiológica adote medidas necessárias de controle e monitoramento das pessoas mais susceptíveis à picada do mosquito e, consequentemente, aos vírus transmitidos por eles.
Durante a visita o agente deve procurar por focos de mosquito tanto nas residências quanto nos quintais e terrenos baldios. O rigor da procura deve ser máximo. Encontrando ou não foco de mosquito o agente deve tratar todos os depósitos que possam se tornar criadouro de mosquito. Encontrando foco, o agente deve coletar amostras num total de até 10 exemplares por depósito foco, identificar o foco no boletim apropriado e remetê-lo ao laboratório para identificação dos exemplares e catalogação cartográfica.
Identificado o imóvel positivo, e os imóveis imediatamente laterais, passam a ser objeto de monitoramento semanal em virtude da exposição dos residentes aos vetores tornando-os susceptíveis a contrair vírus por eles transmitidos. No momento da visita o agente deve procurar saber se a família residente no respectivo imóvel foi vacinada contra FA. Não o sendo a equipe de imunização deve adotar as medidas necessárias para fazê-lo. Ao mesmo tempo o agente deve fazer um trabalho de educação sanitária de modo preventivo. Nas localidades que apresentarem índice de infestação predial igual ou superior a 3% deve-se adotar a aspersão de inseticida por meio aeroespacial de Ultra Baixo Volume-UBV para reduzir a densidade dos vetores reduzindo riscos de transmissibilidade.
Não se faz necessário a captura de mosquitos adultos para efeitos de controle do inseto, salvo para diagnostico de mosquito infectado pelo vírus. Conhecendo os vetores, sabendo de sua ecologia, precisamos atacar fundamentalmente sua fase larvária. Entretanto, sabendo das dificuldades de se ter acesso à TODOS os depósitos naturais da região bloqueio, será fundamental a presença regular do serviço de aspersão de inseticida aeroespacial, medida de controle do mosquito adulto.
No cinturão de bloqueio entomológico deve-se dar atenção especial às borracharias, aos ferros-velhos e aos terrenos baldios se existirem. Esses ambientes são formidáveis para a proliferação dos vetores da FA, pois agrupam muitos e potenciais criadouros de mosquitos com muitos dias de repouso favorecendo o completar do ciclo vital do inseto. Sendo necessário o poder público deve adotar medidas enérgicas para tornar esses ambientes desfavoráveis à proliferação dos mosquitos vetores.
Mapa de definição das áreas de risco para Febre Amarela (em círculos)
Fonte: Reconhecimento Geográfico
De acordo com o quadro demonstrativo dos setores censitários a serem trabalhados na prevenção da febre amarela, o cinturão bloqueio definido pela equipe de Reconhecimento Geográfico estão compreendidos na faixa destacada no mapa acima e classificadas em baixo, médio e alto riscos.
Conclusão
O bloqueio entomológico é uma ação preventiva para evitar que o vírus da FA seja introduzido no centro urbano de Japeri. Sua eficácia depende muito da interdisciplinaridade entre os mais variados serviços do poder público. A equipe de Vigilância Epidemiológica monitorando os susceptíveis; a Secretaria de Obras com limpeza dos terrenos baldios em situação crítica; a equipe de Educação em Saúde com informações e ações educativas esclarecendo os munícipes sobre a situação; os Agentes Comunitários de Saúde visitando regularmente as casas identificadas positivas para os vetores e os Agentes de Controle de Endemias com ações de pesquisa e combate aos vetores.
A situação exige um alerta constante de todos os setores e as medidas necessárias executadas de pronto. Trata-se de evitar que o município seja o precursor da reintrodução do vírus amarílico na zona urbana. O cinturão de bloqueio entomológico é uma zona de monitoramento e ataque aos vetores da FA numa faixa territorial que compreende dezenove (19) setores censitários nos limites da cidade com a Zona de Mata Atlântica das cidades Paracambi, Miguel Pereira, Nova Iguaçu e Queimados.
Todo trabalho executado nesta fase inicial deverá ser repetido pelo menos 6 meses depois para verificação e aferição dos resultados.
Japeri, 10 de janeiro de 2018.
Rildo Ferreira dos Santos
Pedagogo | Técnico Entomologista
Matrícula MS 0516167
29.3 CtrlN
Referências
i Manual de Vigilância Epidemiológica da Febre Amarela, Brasília, 2004. ?? Disponível em https://goo.gl/DH7hbU
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